É hora de reapresentar a "rede social"
Estamos agora em novembro de 2024, e, sim, é hora de reapresentar a ideia, a noção de “rede social”. E de informar a existência de tais redes.
À primeira vista, isto pode soar estranho, afinal, há 20 anos as pessoas usam redes sociais, e há muito elas são bem conhecidas, usadas diariamente por bilhões de pessoas.
E, no entanto, é necessário fazer isso agora, por dois motivos.
O primeiro motivo é que aquele tipo de site na Internet que há 20 anos foi chamado de rede social deixou de existir, e se transformou em outra coisa, muito diferente e muito menos interessante do que o que (aparentemente) se apresentou no momento inicial. No Brasil, aquelas primeiras redes sociais foram abraçadas com entusiasmo e alegria. De repente, agora podíamos saber, de forma remota e em tempo real, aquilo que nossos amigos (escolhiam nos informar sobre o que eles) estavam fazendo, escrevendo, falando, pensando. E podíamos também conhecer novas pessoas e fazer novos amigos (inclusive procurando por afinidades de interesses). E tudo aquilo ainda parecia nos ser dado gratuitamente… Quando começamos a ver publicidade na rede social, ela já deveria ter sido compreendida, e chamada, por seus usuários, de “rede social comercial” – mas não foi; a expressão “rede social” foi mantida na boca dos usuários e também nos veículos de imprensa. E isso continuou assim, mesmo quando, anos depois, ficamos sabendo que estas empresas realizam uma constante coleta e organização dos dados pessoais dos usuários para a criação de perfis publicitários individualizados que são usados para mostrar publicidade de forma direcionada (a pessoas específicas). Ou seja, a “rede social” era, na verdade, uma rede social comercial – uma espécie de cercadinho, ou curral, onde as pessoas são mantidas presas, confinadas, para ver propaganda e comprar os produtos das empresas que anunciam ali (que, com a publicidade direcionada, passaram a atingir pessoas específicas, mobilizando os seus desejos e vulnerabilidades). Assim, estas redes sociais comerciais são, na verdade, e poderiam ser chamadas, especificamente, de redes de marketing e publicidade. Este estado de coisas foi a primeira configuração das redes sociais comerciais. A segunda configuração se apresentou quando, mantidas as atividades anteriores, aquelas redes permitiram que os seus usuários 1) comercializassem ali os seus próprios produtos (transformando a “rede” em um market place), e 2) trabalhassem para as empresas anunciantes e para a rede social comercial, criando contas e canais que, com um número suficiente de “seguidores”, seriam então “monetizáveis” através da exibição (de diversas formas) de publicidade das empresas anunciantes. Ou seja, os usuários que passaram a realizar esta última atividade, passaram a trabalhar como vendedores para as empresas que anunciam na rede social comercial (que, por sua vez, achou que seria melhor dar aos vendedores um nome diferente: “influenciadores”). A este quadro foi acrescentada a criação de um algoritmo, refinado continuamente, que monta as timelines dos usuários e modula a visibilidade dos vendedores (influenciadores) para maximizar os lucros da rede social comercial e das empresas anunciantes (que acharam que seria melhor se chamarem de “marcas”). Sendo este o corrente estado das coisas, é evidente que as atuais redes sociais comerciais não possuem há muito tempo qualquer semelhança com aquelas “redes sociais” que surgiram há 20 anos e nas quais as pessoas se sentiam à vontade para exercer uma sociabilidade on-line alegre, espontânea e desinteressada de perspectivas comerciais.
O segundo motivo pelo qual é necessário agora reapresentar a “rede social” às pessoas é porque, sim, algo que podemos voltar a chamar de rede social, e, agora, melhorada e mais segura, está disponível, na forma daquilo que chamamos de rede social não comercial. Agora, adotando um modelo radicalmente diferente, esta nova versão da rede social não tem publicidade, empresas anunciantes, coleta e classificação de dados pessoais, estratégias para te manter preso e grudado na “plataforma”, vendedores/influenciadores, algoritmos moldados para vender produtos ou regular a visibilidade de pessoas e posts; não há, mesmo, por trás da rede, uma empresa querendo gerar lucro.
Como as pessoas reagirão a esta novidade? As reações virão de dois diferentes grupos: 1) aqueles que usaram as redes comerciais em seu início, quando as suas estratégias comerciais ainda não haviam sido reveladas (e que, então, poderão reconhecer com satisfação algumas semelhanças entre as atuais redes não comerciais e aquelas antigas redes); 2) aqueles, mais jovens, que só conhecem redes sociais com propagandas e algoritmos limitadores e viciantes. O novo modelo de rede social que se apresenta agora irá interessar a estes dois grupos? Este interesse dependeria de quais circunstâncias?
Para conhecer estas redes, assim como o contexto em que elas se encontram, leia a nossa introdução às redes sociais não comerciais.
[06 nov. 2024]
Atualizado em: 07 nov. 2024